A ESCOLA REPRODUTIVISTA E A
EMANCIPADORA – DESAFIOS A SEREM SUPERADOS
Marina de Ávila Noronha
O presente texto,
toma o atual cenário da educação brasileira como um problema que, efetivamente,
ainda não promove a educação de cidadãos atuantes e conscientes no seio desta
sociedade pluriétnica e multicultural, aonde não há, de forma efetiva, relações
étnico-sociais positivas para a construção de uma nação democrática de fato.
São inegáveis os
avanços na educação – acesso, qualidade e equidade – sendo que estes dois
últimos, necessariamente, constituem problema, uma vez que o direito de
aprender ainda precisa ser oportunizado para todos, considerando-se que tal
desigualdade se encontra, comprovadamente, no aspecto racial.
A população
afrodescendente está entre aqueles que mais enfrentam, cotidianamente, as várias facetas do preconceito –
manifestações de racismo, de discriminação, de gênero e outros.
Tais processos
discriminatórios operam no sistema de ensino, levando crianças, adolescentes,
jovens e adultos negros a determinadas trajetórias educacionais bem distintas
dos demais grupos, o que resulta, muitas vezes, em evasão e fracasso.
O dito explicita
as competências a serem desenvolvidas por meio de conteúdo, material didático,
atitudes e valores a serem estabelecidos pelas Instituições de ensino e seus
professores, com apoio e supervisão dos sistemas de ensino, entidades
mantenedoras e coordenações pedagógicas.
Historicamente, segundo Sonia
Penin e Sofia Lerche Vieira, a escola cumpriu uma função social
excludente. A partir do século XX, com os processos de industrialização e
urbanização, a escola passa a representar a condição de modernização dos
países. Em 1932, com o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova a defesa de uma
educação pública, gratuita e laica para todos os brasileiros, sendo que essa
ampliação gerou também, muita improvisação.
A
Legislação passa a marcar o cenário da educação brasileira – século XVIII com a
agricultura, segunda metade do século XVIII e XIX, com a Revolução Industrial –
de mais tecnologia, urbanização – e também com a segunda metade do século XX –
com a Era da Informação e a Sociedade do Conhecimento, uma constante
atualização do conhecimento. A educação deveria seguir quatro pilares: aprender
a conhecer, a fazer, a conviver e a ser, somado a gestão escolar. Apesar dessa
dita modernização, não houve a preocupação com o planejamento, infraestrutura,
plano de aula, formação, etc.
Esta
modernização, consolidou uma identidade a partir da produção de uma perspectiva
de conhecimento e um modo de produzir conhecimento que revela, hodiernamente,
um padrão mundial de poder – colonial/moderno, capitalista e eurocentrado – que
emergindo da empresa colonial continuou capaz de controlar as dimensões de poder,
ser e saber, a partir de uma classificação social racializada. Este tipo de
classificação gera invisibilidade, marginalização e patologia de comunidades
das “zonas periféricas”, – racializadas e colonizadas - enriqueceu e enriquece com a consolidação
frequente desta linha secular moderna. Estabeleceu-se, negando epistemologias e
conhecimentos, o limitando-os. Precisa-se reconfigurar portanto, por parte do
que é nosso.
Baseado nessa
construção identitária, ao longo da história hegemônica, como um modo
civilizatório – branco, europeu, dos grandes heróis, da história linear e
universalizadora - a consciência decolonial vem para acarretar formas de
conhecer, atuar e ser para somar o conhecimento histórico – de relação das
coisas -, com a memória e a memória histórica, revelando, desmantelando e
superando a linha moderno-colonial. Permitindo assim, a educação desempenhar um
papel cada vez mais inclusivo, valorizando o sujeito como cidadão crítico da
sociedade brasileira.
O apoio advindo
da Lei, implica equidade, igualdade nos direitos civis e sociais, culturais e
econômicos, bem como valorização da diversidade – daquilo que difere negros de
outros grupos da população brasileira - assim sendo, políticas de reparações
voltadas para a educação dos negros, devem influir costumeiramente no educando
e na cultura escolar. Esta demanda da comunidade afro-brasileira por
reconhecimento, valorização e afirmação de direitos no que diz respeito a
educação, precisa passar a ser não só apoiada mas aplicada.
Posto isso, a formação
e pesquisa contínua permite repensar o modo como os contratos sociais de
mulheres e homens se dão, – e como podem se romper – a prática da
transdisciplinaridade decolonial, ou seja, a orientação e suspensão de métodos
e disciplinas para decolonizar, des-segregar e des-generar o poder, o ser e o
saber controlados pela colonialidade e referentes a consciência moderna. Trata-se
da pedagogia como, disciplina que versa da educação e suas diferentes formas,
como problemática educativa, sua totalidade e historicidade, seu movimento,
como aborda o autor José Carlos Libaneo.
Desta maneira, a
escola é um espaço físico concebido e direcionado ao aprendizado científico dos
alunos – trata-se da teoria do conhecimento científico, o valor e os limites do
conhecimento humano -, ou seja, diferente do aprendizado informal, o de senso
comum. Tem-se interação com o processo histórico de desenvolvimento da
sociedade. O rompimento com o saber experimental e o de imersão social. Em
contrapartida, com a organização do espaço, tempo e agrupamentos na escola em
que essa instituição, a partir de valores estabelecidos desempenha o papel de
unificação cultural, linguística e política – fundamental também para a
construção dos estados-nação modernos.
Segundo outro
campo da ciência, a neurociência - para garantir uma educação que atenda a
necessidade humana de aprender, transformar e superar as condições limitantes
da vida em sociedade, construindo história e estando presente ativamente na
concretização de ideais – é preciso despertar a emoção ao conteúdo, para
promoção de curiosidade, atenção, foco na aula e no professor.
Para isso, a
autora americana bell hooks em, “Ensinando a transgredir. A educação como
prática de liberdade.” Expõe os processos de segregação racial americana em relação
a educação e a escola, e aos educandos. Ela nos relata a época do apartheid –
regime de segregação racial – onde, “para os negros, o lecionar – o educar –
era fundamentalmente político, pois tinha raízes na luta antirracista. Com
efeito, foi nas escolas de ensino fundamental, frequentadas somente por negros,
que eu tive a experiência do aprendizado como revolução.”, vivências da teórica.
O estudar era um
ato contra-hegemônico, de resistência por parte dos professores que apesar de
não terem definidos termos teóricos praticavam uma pedagogia anticolonial. Este
tipo de educação só era possível, pois os professores trabalhavam com e para os
alunos, conheciam suas subjetividades – família, que igreja frequentava, etc.
Possibilitando, a escola, ser um lugar onde se podia esquecer à noção, muitas
vezes imposta, e reinventar-se através das ideias.
Essa relação de
proximidade revela a importância dos conhecimentos prévios dos estudantes, que
por não serem suficientes, precisam ser somados ao conteúdo/conhecimento do
professor – sendo mediado por ele – e desempenhando uma troca social. Esse
conhecimento prévio, também serve para compreender nossa história, do país, da
nossa localidade dentro da sala de aula.
Correlato a isso,
com o fim do apartheid, essa transição de escolas exclusivamente negras para
escolas brancas, onde o estudante negro era visto como um penetra mostrou-se a
diferença entre educação que trabalha para reforçar a dominação e a educação
como prática da liberdade. Onde o conhecimento passou a se resumir a
informação. Época em que desegregar a sociedade racializada, era realizada
apenas por parte dos estudantes negros. Que acordavam horas antes dos alunos
brancos, atravessavam a cidade e esperavam a chegada dos mesmos, nos pátios
escolares.
O que se esperava
desses alunos negros era a obediência, não o desejo de aprender. Inclusive,
essa ânsia por aprender era vista como ameaça à autoridade branca. Onde os
professores brancos, davam aulas que reforçavam os estereótipos racistas. Para
uma parte da população, a escola já não era mais um ambiente libertador e
acolhedor.
De um lado, uma
Instituição de Sequestro abordada por Nardowski com a “Pedagogização da
infância” em que abrange a disciplina escolar, a hierarquia, a ordem e a
vigilância, enquadrando a escola e quem faz parte dela. E de outro, a escola emancipadora
com a entrada e mais que isso, o reconhecimento e valorização verdadeira de
outros membros, sujeitos da história – mulheres, negros, lgbts. Gerando
entusiasmo dentro do ambiente escolar. Unindo a isto, a voz engajada do
professor não deve ser fixa ou absoluta, precisa mudar de acordo com a
sociedade e seu tempo.
A transformação de uma sala de aula, onde a
maioria dos alunos é branco é um desafio tão grande quanto o de ensinar bem em
um contexto de diversidade, mas que possamos dizer mais sim ao estudante e a
qualidade na educação.
REFERÊNCIAS
BERUTTI, Flávio
& MARQUES, Adhemar. Ensinar e Aprender História. Belo Horizonte: RJ, 2009;
NARDOWSKI,
Mariano. Infância e Poder: conformação da Pedagogia Moderna. Bragança Paulista:
Ed. da Universidade São Francisco, 2001. Coleção estudos CDAPH. Série Historiografia).
HOOKS, Bell.
Ensinando a transgredir: A educação como prática da liberdade. SP: ED. WMF
Martins Fontes, 2013.
PENIN, Sonia T. Sousa;
VIEIRA, Sofia Lerche. Refletindo sobre a função social da escola. In: VIEIRA,
Sofia Lerche (org.) Gestão da Escola. Desafios a enfrentar. Rio de Janeiro:
DP&A, 2002. (Biblioteca ANPAE) p. 13 a 45.
-CF/88 - arts. 205 e 206 e da LDB/96 - arts. 1º a 3º e 12.
LIBANEO, José
Carlos. O dualismo perverso da escola pública brasileira: escola do
conhecimento para os ricos, escola do acolhimento social para os pobres.
Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 38, n. 1, p. 13-28, 2012.
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