O SUCATEAMENTO DO SISTEMA PÚBLICO DE ENSINO BÁSICO DO BRASIL
Vinícius Paz de Araújo
Segundo a Constituição brasileira de 1988, em seu
artigo 205, “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho”. Assegura ainda, no artigo 206, a “igualdade de
condições para o acesso e permanência na escola”.
Entretanto, não é necessário ser nenhum
especialista para constatar que as palavras encantadoras da Constituição passam
bem longe da prática efetiva. O sucateamento (seja ele físico ou não) do
sistema público de ensino básico do Brasil pode ser confirmado a partir de
diversas análises, pesquisas, relatos e resultados.
Dentre as evidências mais gritantes deste sucateamento
destacam-se: a baixa remuneração dos
professores (levantamento do Inep divulgado em 2017 aponta que, 99% dos
professores de educação básica do Brasil ganham menos de R$ 3,5 mil por mês),
constatação que, ao ser cruzada com o tempo de estudo/qualificação dos
profissionais e o custo de vida das cidades brasileiras, é altamente
inconsistente; a Emenda Constitucional 95
(o que configura em um atraso para o desenvolvimento e comprometimento do
futuro da Educação); a Reforma do Ensino
Médio (traduz-se como preocupação com a parte tecnicista, conhecimento
sistematizado e reprodução de práticas; em detrimento da promoção do
questionamento, pensamento crítico e analítico); precariedade da estrutura física as quais são submetidos os alunos e
professores, o que fragiliza fortemente o desenvolvimento pedagógico dos
envolvidos. Luiz Gustavo Mendes, especialista em educação, ressalta que “quando
você atua em uma sala iluminada, com mobiliário adequado e ventilação, o
estímulo à aprendizagem é multiplicado. Se essas condições são contrárias,
certamente os resultados serão ruins”.
As evidências citadas acima favorecem a evasão dos
estudantes dos cursos de licenciatura, cursos estes que já são tidos como de
menor prestígio (basta verificar suas notas de corte nos vestibulares, que são
sempre mais baixas) e têm pouco apoio do governo para garantia de uma boa
formação docente. Assim sendo, torna-se comum a contratação de professores sem
o grau de formação exigido ministrando aulas nas escolas. Dados do Censo
Escolar de 2017, realizado pelo MEC, apontam que cerca de 15% dos professores
em exercício no Brasil não têm ensino superior, fato que contribui diretamente
para a precarização do ensino.
Analisando a questão a partir de uma perspectiva
político-jurídica, é possível identificar a não neutralidade dos governantes ao
elaborarem as leis (nesse caso as leis/mecanismos que regem o sistema
educacional), como por exemplo a subvenção assumida pelo Estado para atividades
particulares com o argumento da falta de capacidade pública (artigo 206, inciso
III e artigo 213 da Constituição de 1988). Há cerca de 40 anos iniciou-se um
movimento no setor privado da educação básica, a ascensão das escolas
particulares só foi possível com a queda da qualidade dos serviços públicos. Ou
seja, o Estado tem sucateado a Educação pública em função de lobistas. Constata-se,
portanto, que o sucateamento da educação não demonstra apenas o descaso ou
irresponsabilidade dos governantes, mas também é um mecanismo que estabelece um
setor bilionário advindo do desmonte da Educação pública, ao passo que estagna
e limita os horizontes profissionais e do saber daqueles que não têm condições
financeiras de arcar com a educação privada.
Uma das maneiras mais viáveis para reverter este
quadro precário da Educação brasileira seria a reivindicação popular dos ideais
da Educação, conforme o artigo 205 e 206 (mencionados anteriormente), estabelecendo
relações com o artigo 208 da Constituição de 1988 (que trata da Educação como
um Direito Público Subjetivo), isso tratando de suportes legais.
Porém, como demonstrado neste próprio texto, existe
ainda, “na forma da lei”, respaldo para o benefício do privado em detrimento do
público, o que no fim das contas, resulta em sucateamento da Educação pública.
Neste caso, o pensamento que prevalece é: “se algo é ruim, prejudicial, não tem
porque continuar se submetendo a ele, portanto, é necessário criticar, lutar,
mudar. Afinal, normas e leis não foram feitas para serem cumpridas, respeitadas
ou seguidas se não favorecerem o bem comum”, o que entra em consonância com a
ideia de Rosa Parks –uma costureira negra estadunidense que, em 1955, se
recusou a ceder seu lugar no ônibus a um homem branco (sim, ela agiu
ilegalmente, à época) e posteriormente, recebida pelo congresso dos Estados
Unidos como "Mãe
do Movimento dos Direitos Civis dos dias atuais" – “Você nunca deve ter medo do que você faz
quando você faz o que é certo. "
Referências:
99% dos
professores brasileiros ganham em média menos de R$ 3,5 mil, diz estudo
<https://g1.globo.com/educacao/noticia/99-dos-professores-brasileiros-ganham-menos-de-r-35-mil-diz-estudo.ghtml>
Acessado em 30 de novembro de 2018
O
sucateamento da educação no Brasil
<http://averdade.org.br/2012/03/o-sucateamento-da-educacao/> Acessado em 30 de novembro de 2018
Na
capital do país, 90% das escolas precisam de reformas, diz TCDF
<https://www.metropoles.com/distrito-federal/auditoria-mostra-que-90-das-escolas-do-df-precisam-de-reformas> Acessado em 30 de novembro de 2018
O ensino público
no Brasil: ruim, desigual e estagnado
<https://epoca.globo.com/ideias/noticia/2015/01/bo-ensino-publico-no-brasilb-ruim-desigual-e-estagnado.html>
Acessado em 30 de novembro de 2018
Não
aceitamos o desmonte da educação brasileira
<http://www.cartaeducacao.com.br/artigo/nao-aceitamos-o-desmonte-da-educacao-brasileira/> Acessado em 30 de novembro de 2018
Censo
Escolar
<http://inep.gov.br/web/guest/censo-escolar>
Acessado em 30 de novembro de 2018
MELO, Adriana Almeida Sales de. Aspectos da coexistência
entre educação pública e privada no Brasil de hoje. In: ROCHA, Maria Zélia
Borba, PIMENTEL, Nara Pimentel (Orgs). Organização da educação brasileira:
marcos contemporâneos Brasília: Editora Universidade de Brasilia, 2016. p. 137
a 169.
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