segunda-feira, 9 de julho de 2018

A EDUCAÇÃO NÃO PODE SER MAIS UM NEGÓCIO



Pietra Giovanna P. de Souza


       Com o surgimento de programas sociais financiados pelo governo e vinculados à educação como o Fies (2000) e o ProUni (2014), parcelas da população que normalmente não teriam a oportunidade de acesso ao ensino superior em outras situações, começaram a compor e ocupar espaços em faculdades e universidades privadas. Como consequência desses programas, o setor da educação brasileira vem apresentando grandes e rápidos saltos quantitativos nas últimas décadas.
As instituições privadas através dos programas, de fato, possibilitam a oportunidade de acesso e formação de muitos estudantes, sendo que milhares destes contam com empréstimos do fundo de financiamento estudantil do ministério da educação (Fies) para custear sua educação, mas ao mesmo tempo embute uma distorção que corresponde ao subsídio sem risco para grandes conglomerados de ensino que entram em condição de inadimplência, pois se sustentam pelo Estado.
Com o fim das relações empresa e cliente e/ou aluno e instituição, que passam a ocorrer entre governo federal e instituição de ensino, os setores privados de educação encontram a oportunidade de um negócio ideal: sem risco, com clientes cativos e receitas garantidas. Assim, a educação entra em território capitalista onde se iniciam os movimentos dos aglomerados em busca de aquisições de escolas de ensino superior pelo Brasil, que resultam em um grande processo de fusões e, posteriormente, no nascimento de empresas multinacionais de ensino. Os espaços que eram, até então, de liberdade de pensamento passam a se converter em espaços de livre de mercado.
O controle da educação por grupos mais preocupados com as obtenções de lucros do que com a qualidade de ensino propriamente fornecido, contribuem com as disseminações de lógicas meritocráticas, avaliações de desempenho e mecanismos de controle, além das privações da autonomia docente.
  Nesse cenário, as instituições de ensino superior perdem seu real sentido e essência enquanto locais que promovem reflexões, experimentações e incentivos ao pensamento crítico em relação a questões de desenvolvimentos sociais, econômicos e políticos da sociedade, sendo de fato emancipadoras e autônomas, enquanto atendem demandas que elas próprias geram em função das evoluções dos processos de conhecimento, e não das expectativas do mercado.
                            Nas discussões cotidianas, quando pensamos em currículo pensamos apenas em                                                 conhecimento, esquecendo-nos do que o conhecimento que constitui o currículo está                                        inextricavelmente, centralmente, vitalmente, envolvido naquilo que somos,
                              naquilo que nos tornamos: na nossa identidade, na nossa subjetividade. (SILVA, 2015, p.15)

Ao tratar a educação, primeiramente, como um produto rentável se reduz o indivíduo a condição de um objeto maleável de acordo com a vontade daqueles que detém o poder ou que pagam mais. Entra em xeque, não apenas o conhecimento e integridade humana, mas também todo o futuro e projeto de País.
Não se pode considerar a educação um negócio, pois ela está ligada a uma série de processos essenciais ao desenvolvimento do ser enquanto cidadão, enquanto humano. Se desprender dessa lógica perversa de mercado representa mais do que a urgência ao conhecimento e a integridade, significa pensar e dar valor a vida.
A educação que queremos não é nada além do que a educação que precisamos,  aquela que não nos ponha à venda, aquela que não subestime nossa capacidade e valor, aquela que priorize qualidade acima de quantidade, aquela que faça as perguntas certas, aquela que possibilite espaços ativos de diálogo, aquela que zele pelos nossos direitos, aquela que realmente se torne a nossa voz.

REFERÊNCIAS
SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade: uma introdução às teorias de currículo. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015
FEPESP. O negócio da educação: A aventura das universidades privadas na terra do capitalismo sem risco. São Paulo: Olho d’água, 2017.

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