Pietra
Giovanna P. de Souza
Com o surgimento de programas
sociais financiados pelo governo e vinculados à educação como o Fies (2000) e o
ProUni (2014), parcelas da população que normalmente não teriam a oportunidade
de acesso ao ensino superior em outras situações, começaram a compor e ocupar
espaços em faculdades e universidades privadas. Como consequência desses
programas, o setor da educação brasileira vem apresentando grandes e rápidos
saltos quantitativos nas últimas décadas.
As
instituições privadas através dos programas, de fato, possibilitam a
oportunidade de acesso e formação de muitos estudantes, sendo que milhares
destes contam com empréstimos do fundo de financiamento estudantil do ministério
da educação (Fies) para custear sua educação, mas ao mesmo tempo embute uma
distorção que corresponde ao subsídio sem risco para grandes conglomerados de
ensino que entram em condição de inadimplência, pois se sustentam pelo Estado.
Com
o fim das relações empresa e cliente e/ou aluno e instituição, que passam a
ocorrer entre governo federal e instituição de ensino, os setores privados de
educação encontram a oportunidade de um negócio ideal: sem risco, com clientes
cativos e receitas garantidas. Assim, a educação entra em território
capitalista onde se iniciam os movimentos dos aglomerados em busca de
aquisições de escolas de ensino superior pelo Brasil, que resultam em um grande
processo de fusões e, posteriormente, no nascimento de empresas multinacionais
de ensino. Os espaços que eram, até então, de liberdade de pensamento passam a
se converter em espaços de livre de mercado.
O
controle da educação por grupos mais preocupados com as obtenções de lucros do
que com a qualidade de ensino propriamente fornecido, contribuem com as
disseminações de lógicas meritocráticas, avaliações de desempenho e mecanismos
de controle, além das privações da autonomia docente.
Nesse
cenário, as instituições de ensino superior perdem seu real sentido e essência
enquanto locais que promovem reflexões, experimentações e incentivos ao
pensamento crítico em relação a questões de desenvolvimentos sociais,
econômicos e políticos da sociedade, sendo de fato emancipadoras e autônomas,
enquanto atendem demandas que elas próprias geram em função das evoluções dos
processos de conhecimento, e não das expectativas do mercado.
Nas
discussões cotidianas, quando pensamos em currículo pensamos apenas em conhecimento, esquecendo-nos do que o conhecimento que constitui o currículo está inextricavelmente, centralmente, vitalmente, envolvido naquilo que somos,
naquilo que nos tornamos: na nossa identidade, na nossa subjetividade. (SILVA, 2015, p.15)
naquilo que nos tornamos: na nossa identidade, na nossa subjetividade. (SILVA, 2015, p.15)
Ao
tratar a educação, primeiramente, como
um produto rentável se reduz o indivíduo a condição de um objeto maleável de
acordo com a vontade daqueles que detém o poder ou que pagam mais. Entra em
xeque, não apenas o conhecimento e integridade humana, mas também todo o futuro
e projeto de País.
Não
se pode considerar a educação um negócio, pois ela está ligada a uma série de
processos essenciais ao desenvolvimento do ser enquanto cidadão, enquanto
humano. Se desprender dessa lógica perversa de mercado representa mais do que a
urgência ao conhecimento e a integridade, significa pensar e dar valor a vida.
A educação que queremos não é nada
além do que a educação que precisamos,
aquela que não nos ponha à venda, aquela que não subestime nossa
capacidade e valor, aquela que priorize qualidade acima de quantidade, aquela
que faça as perguntas certas, aquela que possibilite espaços ativos de diálogo,
aquela que zele pelos nossos direitos, aquela que realmente se torne a nossa
voz.
REFERÊNCIAS
SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade: uma
introdução às teorias de currículo. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015
FEPESP. O negócio da educação: A aventura das universidades privadas na
terra do capitalismo sem risco. São Paulo: Olho d’água, 2017.
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