terça-feira, 10 de julho de 2018

ENTRE A EDUCAÇÃO GLOBAL E LOCAL





Ana Claudia Knihs de Camargo 

               A modernidade advinda das transformações históricas que ocorreram no mundo a partir do século XX com todo o aparato da revolução tecnológica, de informação e de comunicação colocou a sociedade e todas as suas relações sociais, políticas e econômicas em um novo ritmo, agora muito mais interligado, instantâneo e individualizado. Tudo que é solido desmancha no ar, o leque de categorias mercantilizáveis só se expande e a educação, que antes era tida como um direito social garantido pelo Estado, é cada vez mais atacada pela ideologia de consumo. Segundo Baumann em Vidas para Consumo, o projeto total de globalização envolve fazer com que todas as relações sociais se tornem mercadoria, inclusive o indivíduo: ele faz de si seu próprio currículo, precisando agregar valor à sua própria imagem - com cursos de francês, de capacitação, projetos de pesquisa para colocar no lattes - para conseguir se colocar em uma posição social de maior prestígio ou, ao menos, manter-se ativo nessa sociedade de consumo. 
      Dessa forma, a educação também se torna uma mercadoria, a venda do ensino se torna possível e o aluno se torna um mero consumidor. Há corporações brasileiras donas de grande parte do ensino superior privado no Brasil que lucram com a venda desse serviço, além de um extenso grupo de donos de escolas de nível infantil e médio. É, também, a resposta do projeto neoliberal cada vez mais presente no Brasil, que sucateia e precariza todos os bens públicos - inclusive a educação - para depois privatizá-los.
       O problema da educação nesse molde é que a torna uma mercadoria como qualquer outra - sujeita a oscilações de mercado, da redução da qualidade para maximizar o lucro, enfim, a coloca numa ética de concorrência que não condiz com o que o projeto da educação deveria ser - crítico, autônomo, independente, baseado em troca de idéias e na livre circulação de pensamentos. Esse problema se encontra em todos os níveis de ensino: do infantil ao superior - mesmo que acontecendo de maneiras diferentes. A militarização das escolas, o projeto de escola sem partido e o sucateamento financeiro das universidades públicas são exemplos de estratégias políticas que pretendem acabar com toda a capacidade de ensino crítico e questionador que essas instituições deveriam ter.
         Se, para Marx,“as idéias da classe dominante são as idéias dominantes”, a ideologia de ensino globalizada sempre traz o ensino a partir da perspectiva do Norte Global, apagando toda a identidade, as subjetividades e reduzindo à mínimo o ensino da história dos países de periferia. Na escola ensinam muito sobre a os países de lá, aprendemos inglês e só muito recentemente incorporaram o espanhol como obrigatório no ensino público, nosso currículo é composto por muito da história dos países que nos coloniza(ra)m, mas extremamente pouco da nossa própria história, das nossas guerras e revoluções, dos nossos heróis, dos nossos folclores e tradições, da história dos nossos países vizinhos, etc. É a colonialidade do saber atrelada ao projeto de ensino neoliberal.
         Dessa forma, é muito importante que a nossa luta e as nossas críticas aos cortes na educação não se façam de maneira estritamente econômica: não são só verbas que estão sendo cortadas, mas também a liberdade de pensamento e de circulação de ideias. É uma tendência mundial que segue em vigor e principalmente nós, enquanto um país situado no Sul Global, devemos lutar contra se quisermos defender um ensino público nacional que crie pessoas questionadoras e críticas.

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