Ana Claudia Knihs de Camargo
A modernidade advinda das transformações históricas que ocorreram
no mundo a partir do século XX com todo o aparato da revolução tecnológica, de
informação e de comunicação colocou a sociedade e todas as suas relações
sociais, políticas e econômicas em um novo ritmo, agora muito mais interligado,
instantâneo e individualizado. Tudo que é solido desmancha no ar, o
leque de categorias mercantilizáveis só se expande e a educação, que antes era
tida como um direito social garantido pelo Estado, é cada vez mais atacada pela
ideologia de consumo. Segundo Baumann em Vidas para Consumo, o
projeto total de globalização envolve fazer com que todas as relações sociais
se tornem mercadoria, inclusive o indivíduo: ele faz de si seu próprio
currículo, precisando agregar valor à sua própria imagem - com cursos de
francês, de capacitação, projetos de pesquisa para colocar no lattes -
para conseguir se colocar em uma posição social de maior prestígio ou, ao
menos, manter-se ativo nessa sociedade de consumo.
Dessa
forma, a educação também se torna uma mercadoria, a venda do ensino se torna
possível e o aluno se torna um mero consumidor. Há corporações brasileiras
donas de grande parte do ensino superior privado no Brasil que lucram com a
venda desse serviço, além de um extenso grupo de donos de escolas de nível
infantil e médio. É, também, a resposta do projeto neoliberal cada vez mais
presente no Brasil, que sucateia e precariza todos os bens públicos - inclusive
a educação - para depois privatizá-los.
O problema da educação nesse molde é que a torna uma
mercadoria como qualquer outra - sujeita a oscilações de mercado, da redução da
qualidade para maximizar o lucro, enfim, a coloca numa ética de concorrência
que não condiz com o que o projeto da educação deveria ser - crítico, autônomo,
independente, baseado em troca de idéias e na livre circulação de pensamentos.
Esse problema se encontra em todos os níveis de ensino: do infantil ao superior
- mesmo que acontecendo de maneiras diferentes. A militarização das escolas, o
projeto de escola sem partido e o sucateamento financeiro das universidades
públicas são exemplos de estratégias políticas que pretendem acabar com toda a
capacidade de ensino crítico e questionador que essas instituições deveriam
ter.
Se, para Marx,“as idéias da classe
dominante são as idéias dominantes”, a ideologia de ensino globalizada
sempre traz o ensino a partir da perspectiva do Norte Global, apagando toda a
identidade, as subjetividades e reduzindo à mínimo o ensino da história dos
países de periferia. Na escola ensinam muito sobre a os países de lá,
aprendemos inglês e só muito recentemente incorporaram o espanhol como
obrigatório no ensino público, nosso currículo é composto por muito da história
dos países que nos coloniza(ra)m, mas extremamente pouco da nossa própria
história, das nossas guerras e revoluções, dos nossos heróis, dos nossos
folclores e tradições, da história dos nossos países vizinhos, etc. É a
colonialidade do saber atrelada ao projeto de ensino neoliberal.
Dessa
forma, é muito importante que a nossa luta e as nossas críticas aos cortes na
educação não se façam de maneira estritamente econômica: não são só verbas que
estão sendo cortadas, mas também a liberdade de pensamento e de circulação de
ideias. É uma tendência mundial que segue em vigor e principalmente nós,
enquanto um país situado no Sul Global, devemos lutar contra se quisermos
defender um ensino público nacional que crie pessoas questionadoras e críticas.
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