Claudio Henrique Modesto Kffuri
A seguinte entrevista fora realizada via e-mail com o Prof. José Pacheco.Educador, pedagogo e criador da Escola da Ponte em Portugal, ele foi voluntário no Projeto Âncora em Cotia-SP e atualmente é integrante do grupo EcoHabitare operando no Projeto Gaia Escola em Brasília-DF.
Eu conheci o Prof. Pacheco em março de 2016 e desde então entramos em contato esporadicamente, o professor aceitou gentilmente o meu convite para participar desta entrevista.
Seguem abaixo as perguntas e suas respectivas respostas:
1. Como se constitui a identidade profissional do professor?
No processo de elaboração de identidade profissional, a formação de professores talvez opere o maior impacto. Uma formação de professores, que continua imersa em equívocos, cativa de um modelo cartesiano, que impede um re-ligare essencial. Sabemos que um formador não ensina aquilo que diz, mas transmite aquilo que é, veicula competências de que está investido. Mas, ainda há quem ignore a
existência do princípio do isomorfismo na formação, quem creia que a teoria precede a prática, quem considere o formando como objeto de formação, quando deveria ser tomado como sujeito em autotransformação, no contexto de uma equipe, com um projeto. Prevalecem práticas carentes de comunicação dialógica, culturas de formação individualistas, de competitividade negativa, de que está ausente o trabalho em equipe.
2. Como começou sua profissão, quem o incentivou ou não, onde e como foram as primeiras aulas?
O tempo anterior à minha chegada à Escola da Ponte foi de reprodução de uma cultura profissional, que me havia sido inculcada. Confesso que o incômodo era grande. Nos idos de 1976, eu estava quase a desistir de ser professor. Sentia que, “dando aula”, eu estava a excluir gente. Percebi que não devia continuar dando aula, mas eu não sabia fazer mais nada! Só sabia dar aula. A Ponte surgiu, talvez não por acaso, para me dar uma última oportunidade.
Foi, então, que aconteceu algo inusitado. Como quaisquer outros professores, éramos profissionais competentes. Porém, deparávamos com a falta de um compromisso ético com a profissão. Quando modificamos o modo, asseguramos a todos o direito de ser sábio e feliz. Começamos a receber alunos expulsos de outras escolas, alunos chamados “deficientes”, acolhíamos jovens evadidos de outras escolas, enfim! Todos se transformavam e aprendiam.
Quando fiz as primeiras intervenções públicas, mais do que dizerem que o projeto era um arroubo de jovem professor, diziam-me que, quando eu fosse mais velho, iria ganhar juízo. E os detratores agiram de forma violenta explícita. O sofrimento maior foi termos descoberto que muitos desses ataques eram provenientes de escolas próximas. Apercebemo-nos de que o maior aliado de um professor é o outro professor, mas, também, de que o maior inimigo de um professor, que ouse fazer diferente para melhor, é o professor da escola do lado. A nossa identidade profissional já conflitava
com outras identidades.
3. Como a identidade profissional dos professores se relaciona com o compromisso que estes devem assumir com a comunidade?
Reflitamos sobre aquilo que nos diz a Constituição da República. Ela consagra o direito à educação, diz-nos que é dever do Estado garantir a educação a todos os brasileiros. Se, do modo como trabalham, as escolas brasileiras não asseguram a todos esse direito, as escolas terão o direito a continuar a trabalhar desse modo? Mais do que habilidades de natureza técnica, científica, ou pedagógica, o que prevaleceu foi a necessidade de coerência entre a proposta e as práticas efetivas.
Comentário.
Um dos temas abordados no texto da Profa. Claisy Marinho-Araújo é a interdependência da formação pessoal e profissional do professor ou professora, visto que a forma de ensino é influenciada pelos valores, necessidades, ideologias e crenças pessoais.
Isso é abordado pelo Prof. Pacheco na resposta à primeira pergunta, ideia sintetizada explicitamente na frase “Sabemos que um formador não ensina aquilo que diz, mas transmite aquilo que é, veicula competências de que está investido.”
No texto, a autora também afirma que é preciso ter consciência desse processo de construção, e ainda na resposta à primeira pergunta o Prof. Pacheco aponta o risco que corre o processo pedagógico quando não há compreensão desse isomorfismo.
Mediante o exposto, o texto e a entrevista parecem convergir em suas conclusões, de que o professor ou professora deve construir uma identidade profissional articulada entre formação inicial e formação continuada, buscando a interdependência entre teoria, prática e sua subjetividade.
Bibliografia:
Marinho-Araújo, Claisy. Conceitos e ideias acerca da identidade do professor. In: Cynthia Bisinoto. (Org.) Docência na Socioeducação. 1ed.Brasília, v. 1, p.29-38.
Nenhum comentário:
Postar um comentário