sexta-feira, 31 de maio de 2019

O CAPITAL CULTURAL E A IDEOLOGIA DO MÉRITO: DESAFIOS PARA UM ENSINO DEMOCRÁTICO
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                                                                                        Mateus Paula Leite Paz 
No presente ensaio buscaremos refletir junto a Bourdieu e a categoria central à sua obra “capital cultural” acerca da imagem estabelecida nas sociedades contemporâneas da escola como um meio de ascensão social, e assim, vislumbrar por meio dessa perspectiva alguns dos principais desafios à educação no Brasil.
Bourdieu percebe a escola como uma força de conservação social, que serve à manutenção da estratificação de classes sociais. Justamente por parecer este ambiente onde se percorre por mérito, a escola invisibiliza o processo de exclusão escolar. Este processo se caracteriza pela desigualdade de condições com que as crianças de diferentes classes ocupam as escolas públicas e privadas, gerando consequências em relação às oportunidades futuras de conquistar os diplomas de ensino superior, técnico ou pós-graduação. (BOURDIEU, 1966, p.5)
A noção de capital cultural vai servir então para pensarmos de que forma o conhecimento e as disposições comportamentais transmitidas pela família aos indivíduos corrobora para o processo de êxito ou fracasso escolar.
No caso do estudo de Bourdieu, fica entendido que há uma relação diretamente proporcional entre o nível de estudo dos pais e a chance de êxito no percurso do ensino. Essa relação estaria determinada não só pelo acesso desigual das classes à informação, ou seja, aos códigos, normas, valores, linguagens que compõe o ambiente escolar, mas também pelo nível de expectativas de ascensão social que os indivíduos dessas diferentes classes depositam sobre o ensino escolar.
O capital cultural, portanto, resulta no privilégio cultural das elites, através do qual são depositados sobre os indivíduos oriundos dessas classes, mesmo que de forma não planejada, as disposições através das quais ele irá obter sucesso escolar. (BOURDIEU, 1966, p.6 a 8)

Esse mascaramento dos privilégios que o sistema escolar produz é, na verdade, resultado de uma pedagogia específica, meritocrática, que tende a tratar todos como iguais, quando na verdade as pessoas são desiguais. Isto é, focando em pensar um ensino melhor para todos, deixou-se de pensar no ensino melhor para cada um com suas idiossincrasias. Desse modo, a escola só pode continuar a reproduzir privilégios de classe e não libertar as pessoas deles.(BORDIEU, 1966, p. 9 e 10)
É por isso que um ensino mais democrático deve buscar diminuir essa diferença que resulta não do mérito, mas apenas do privilégio, de modo que pessoas de diferentes classes sociais possam ter igualdade de concorrência nas variadas instâncias de ascensão social.
Na verdade, não podemos pensar em um desafio maior ao ensino que esse. Isto  porque o debate sobre o privilégio das classes médias e altas no Brasil toca em pontos vitais da legitimidade do poder dessas classes sobre a imensa massa de mão-de-obra superexplorada.
Se não formos capazes de refletir em conjunto sobre formas de democratizar o ensino e fazê-lo um instrumento de promoção de oportunidades, em vez de um grande pente fino ao qual só resistem as elites, então ainda teremos um longo caminho até estabelecer uma sociedade verdadeiramente democrática, já que a educação como um todo reflete a agenda e as prioridades de um Estado comprometido com o interesse das grandes empresas e corporações em detrimento dos interesses da classe dos trabalhadores.

Referência Bibliográfica


BOURDIEU, Pierre. A escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura. Educ. Rev. 1989, n.10, pp. 05-15.
SOUZA, Jessé, “A cegueira do debate brasileiro sobre as classes sociais e a pobreza do debate político” e “As manifestações de junho e a cegueira política das classes”. In: A Tolice da Inteligência Brasileira. Ou como o país se deixa manipular pela elite. São Paulo, Leya, 2015, p. 221-252.
SOUZA, Jessé. A ética protestante e a ideologia do atraso brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 1998, vol. 13, no 38.



                                                                               Mateus Paula Leite Paz

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