domingo, 2 de junho de 2019

SOBRE POSSIBILIDADES NA UNIVERSIDADE: DA SOLIDÃO E SOFRIMENTO À INCLUSÃO E ACOLHIMENTO NO AMBIENTE ACADÊMICO 

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                                                                                                Thaís Feiten Motta    
    
“Ser uma universidade inovadora e inclusiva, comprometida com as finalidades essenciais de ensino, pesquisa e extensão, integradas para a formação de cidadãs e cidadãos éticos e qualificados para o exercício profissional e empenhados na busca de soluções democráticas para questões nacionais e internacionais, por meio de atuação de excelência”.

Esse é o texto que encontramos ao acessar a página onde está a missão da nossa Universidade de Brasília (UnB), disponível em seu site oficial. Se estendermos, então, o olhar para a nossa constituição federal, mais especificamente para o artigo 205, é possível encontrar certa semelhança no que diz respeito ao propósito da educação no Brasil:

"A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho".

O que podemos ver aqui?
No entendimento da Constituição Federal, a educação há de ser, essencialmente, incentivada e, de fato, promovida, para o nosso pleno desenvolvimento, para o nosso preparo ao exercício da cidadania e para a nossa qualificação para o trabalho. Nessa mesma perspectiva encontra-se a missão da UnB: a formação de cidadãos e cidadãs éticos e qualificados para o exercício profissional. Embora perceptivelmente elaborada à luz de nossa constituição federal, é pertinente observarmos que na dita missão não consta o nosso pleno desenvolvimento. Em que pesem possíveis divergências nos pormenores do que seria um desenvolvimento pleno, há de se convir que ele implica questões que vão além da educação pelo mero repasse e prática de conteúdos, que vão além da vida acadêmica e profissional per si.
Nesse contexto convido-nos a todos, estudantes universitários, a fazer uma reflexão. Será que a universidade está empenhada, ou até mesmo interessada, em colaborar para um desenvolvimento que ultrapasse a nossa vida acadêmica, que nos veja além de detentores de força de trabalho e de responsabilidade cidadã? Assim, dentro do que podemos contemplar como nosso pleno desenvolvimento, chamo-lhes a atenção para algo necessário ¾ a nossa integração à comunidade acadêmica, atrelada ao nosso bem-estar emocional em meio ao ambiente da universidade.
Ela nos segue pelos corredores, escadarias, salas de estudo. Quando tudo o que esperamos é encontrar um rosto amigo, olhamos para os lados e lá está ela, com a sua fria face, a solidão. E o irônico é que a solidão não anda só. Ela traz consigo um íntimo amigo, o sofrimento. E nesse encontro, somos nós, estudantes, que nos desencontramos de nossos sonhos, perspectivas, ambições, esperanças.
Venturini e Goulart (2016, p.102) esquematizam fatores que tornam o ambiente acadêmico excludente e solitário, em contraste com um ambiente acadêmico acolhedor e inclusivo. Na perspectiva dos autores, fatores como espírito competitivo dominante, tendência seletiva e meritocrática, pressão excessiva que vise apenas a aumentos quantitativos de produção científica, incentivo de aprendizagem individual em detrimento da coletiva e social e desatenção aos problemas frustrantes e estressantes a que se submete a comunidade acadêmica promovem um ambiente de exclusão e solidão. De fato, não são raros os momentos em que sentimos que não nos encaixamos bem, que não somos bons o suficiente, que estamos sozinhos e/ou que não temos amparo dentro da universidade; menos raro, ainda, é encontrarmos colegas que se sintam assim. Aqui estamos todos nós, mas, ao mesmo tempo, parecemos não nos ver uns aos outros ¾ e nem sermos vistos.
Venturini e Goulart demonstram por meio de sua pesquisa, também, que uma universidade pode se tornar acolhedora e inclusiva quando promove, entre outros, fatores como: clima humanamente estimulante e motivador, no qual os estudantes encontram oportunidades de formação e que lhes permite construir ativamente suas identidades, atenção para o papel da vida emocional e para a qualidade das relações humanas, atenção e compreensão para situações de distúrbios psicológicos e para implementar ações de proteção e, além disso, estímulo do fortalecimento da comunidade universitária. Nessa perspectiva, podemos refletir que é uma possibilidade e escolha por parte da universidade não excluir e não promover a solidão e o sofrimento em sua comunidade; é uma possibilidade de escolha o tipo de ambiente, de relações e de formação que propicia.
Sendo assim, é importante que a universidade demonstre atenção e zelo pelo bem-estar de sua comunidade, atentando-se para as suas necessidades não só acadêmicas e profissionais, mas também relacionais, psicológicas, emocionais e de construção de sujeitos ¾ sempre considerando a formação coletiva e integrada de seus membros. Nesse sentido, em relação a nós, estudantes, a universidade pode, por exemplo, estimular e até mesmo solicitar tratamento mais humanizado e compreensivo de professores para conosco, disponibilizar serviços de atendimento e aconselhamento psicossocial, oferecer eventos, palestras e disciplinas que nos incentivem e entusiasmem em nossa trajetória acadêmica. Pode, também, estabelecer a criação de grupos acadêmicos para a realização de atividades extraclasse diversas (como grupos de pintura, desenho, escultura, dança, teatro, esportes, fotografia, música, culinária, leitura, escrita, debate, viagens, trabalho voluntário, apoio emocional, entre tantas outras opções), que possam promover maior integração entre nós, inclusive entre colegas de cursos diferentes, por meio de interesses que transpassam a nossa vida puramente acadêmica e profissional. Acima de tudo, a universidade poderá se tornar um ambiente acolhedor, inclusivo e que oferece caminhos para um desenvolvimento pleno, não somente a nós estudantes, mas a todos que dela fazem parte, a partir do momento em que decidir de fato sê-lo e, então, dar voz à sua comunidade para que todas as boas intenções e ideias possam se tornar realidades.

Referências Bibliográficas: 

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

VENTURINI, E.; GOULART, M. S. B. Universidade, solidão e saúde mental. Interfaces – Revista de Extensão da UFMG, Belo Horizonte, v. 4, n. 2, p.94-115, jul./dez. 2016.

UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA. Missão institucional.
Disponível em: < https://www.unb.br/a-unb/missao?menu=423>. Acesso em: 29 de novembro de 2018.


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