sábado, 1 de junho de 2019

O TSUNAMI CHEGOU NA EDUCAÇÃO 


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Arthur Ulhôa Kurrle 

          Uma onda conservadora tomou conta do Brasil. Como um tsunami, a grande maioria, se não todos os aspectos da vida social foram atingidos com seu avanço. Essa onda carrega consigo uma nova forma de pensar o ser humano através da ótica da competição e do desempenho. Essa visão se baseia nos princípios do neoliberalismo, que passa a orientar as diversas relações sociais. As instituições públicas foram as primeiras a serem atacadas, e a educação, por ser um dos principais aparelhos ideológicos do Estado, se tornou o alvo preferido da razão neoliberal.
         O panorama é preocupante, pois direitos estão sendo atacados e a democracia corre perigo. Na escola, as consequências são professores silenciados, alunos incentivados a delatar “desvios”, disciplinas ignoradas, um aumento da intolerância frente ao outro. Dessa forma, a escola pública precisa ser defendida, mas além disso, novas práticas pedagógicas que propiciem o diálogo precisam ser implementadas.
        A crise do sistema capitalista que se iniciou em 2008 se tornou global e contínua. A classe dominante de diversos países, para proteger seus lucros, defenderam e incentivaram políticas neoliberais, caracterizadas pela austeridade, privatização e flexibilização das legislações trabalhistas, provocando o aumento da atuação do mercado e a proteção deste por parte do Estado (FRIGOTTO, 2017). No Brasil não foi diferente, o impeachment da presidenta Dilma Rousseff levou ao poder um governo com orientações neoliberais, o que permitiu a emergência das reformas da previdência, trabalhista e do ensino médio, além da pec 55/2016, que congelou o investimento no serviço público por vinte anos. Entretanto, esse foi só o início das mudanças que estavam por vir. Projetos de lei de caráter moralista começaram a ser discutidos, com a promessa de “superar a crise política e moral” que supostamente o país enfrentava. Esses projetos, somados a eleição de Jair Bolsonaro, são a expressão de uma nova forma de pensar as relações sociais.
        Para proteger e garantir a manutenção da ordem social capitalista, a escola se torna um importante instrumento. De acordo com Althusser, a escola é um dos principais aparelhos ideológicos do Estado, isso significa que é através da escola que “a ideologia é realizada e se torna dominante” (LINHARES, MESQUIDA, SOUZA, p. 1501). Dessa forma, com o objetivo de fazer as instituições de ensino servirem aos interesses da classe dominante, uma série de mudanças estão sendo articuladas. Para Dardot e Laval, o neoliberalismo exige que os indivíduos se tornem sujeitos da competição e do desempenho. Seguindo esse objetivo, o sistema educacional precisa formar alunos com saberes práticos e técnicos. A Reforma do Ensino Médio colocou isso em prática, valorizando as disciplinas exatas, e desobrigando o ensino de outras matérias, como filosofia e a sociologia. Já um outro projeto em discussão no Congresso, o Escola sem Partido, atua em um outro sentido, mas seguindo os mesmos princípios. Se for aprovado, os professores estarão proibidos de manifestar suas opiniões políticas. Escondido atrás do princípio da neutralidade, o Escola sem Partido é uma tentativa de coibir qualquer posição contrária à ideologia neoliberal. A escola se tornaria um espaço de desconfiança, onde “a pedagogia da confiança e do diálogo crítico é substituída pelo estabelecimento de uma nova função: estimular os alunos e seus pais a se tornarem delatores” (FRIGOTTO, 2017).
          O cenário é de incertezas. O futuro do país e da escola é nebuloso, e não é possível prever qual o limite desse tsunami neoliberal. Mas uma atitude se mostra urgentemente necessária, o diálogo. A crescente competição entre os indivíduos, a desconfiança e o medo, afastam as pessoas uma das outras, impedindo qualquer ação em coletivo. A maneira para se superar o distanciamento, tanto em um ambiente micro como em um macro, é a escuta, a fala e a empatia. A escola se torna um ambiente essencial para a prática do diálogo e da empatia, através de atividades didáticas que permitam a expressão e a troca entre os alunos. É necessário fazer um estudo e levantar possibilidades sobre essas formas alternativas de ensino, que já estão em prática em diversas instituições. O CAP (comunidade de aprendizagem do Paranoá) é um exemplo. Na CAP não há salas de aulas e nem divisão por idades. O ensino é feito junto à comunidade e o meio no qual ela está inserida. Esse tipo de escola permite o desenvolvimento sem a competição com os demais colegas, e a construção de uma visão de mundo mais horizontal e heterogênea.
        É um sonho distante modificar todo o sistema de ensino brasileiro para que ele se torne mais humano. Entretanto, mesmo que individualmente, a prática da escuta e da empatia já proporciona uma quebra da lógica neoliberal, voltada à competição e ao individualismo exacerbado. Só assim será possível se manter firme em tempos sombrios que estão por vir.

Bibliografia:
DARDOT, P; LAVAL, C. A nova razão de mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. ed. Boitempo. França. 2014.
FRIGOTTO, G. A gênese das teses do Escola sem Partido: esfinge e ovo da serpente que ameaçam a sociedade e a educação. In. Escola “sem” Partido. ed. Laboratório de Políticas Públicas (LPP-UERJ). Rio de Janeiro. 2017.
LINHARES, L,L; MESQUIDA, P; SOUZA, L. Althusser: a escola como aparelho ideológico de Estado.

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